No
dia 22 de junho de 2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou uma escola
pública a indenizar uma aluna que sofreu bullying
dentro da instituição.
Esta
condenação é histórica devido a importância para o mundo jurídico e
educacional, sobretudo aos interessados no tema bullying.
Neste
texto será explicado de forma pormenorizada a teoria da responsabilidade civil
utilizada como fundamento principal para responsabilizar a escola pelo fato
ocorrido.
Para
isso, colacionar-se-á aqui a jurisprudência Paulista:
AÇÃO
INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS. BULLYING EM ESTABELECIMENTO ESCOLAR. Pretensão de
reparação por danos morais, em razão de bullying em escola estadual. Abaixo
assinado por colegas de classe para mudança de turma da autora, criança com
retardo mental leve e transtornos hipercinéticos. Negligência do professor
comprovada. Dano in re ipsa e nexo causal comprovados. RECURSO DA RÉ PROVIDO EM
PARTE, COM DETERMINAÇÃO. RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDO.
(TJSP; Apelação 0020533-60.2011.8.26.0562; Relator
(a): Alves Braga Junior; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Público; Foro de
Santos - 1ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 19/06/2018; Data de
Registro: 22/06/2018)
A
Responsabilidade Civil é pontificada no art. 186, do Código Civil de 2002 aonde
diz: “aquele que, por ação ou omissão voluntaria, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete
ato ilícito”, e é aonde iremos buscar elementos para entender a
responsabilidade da escola pública pelo ocorrido no julgamento em análise.
Em
primeiro lugar, devemos observar que somos responsáveis pelos atos que
praticamos mesmo quando não há a vontade direta de produzir danos, bastando,
para sermos responsáveis, somente a consciência do risco de produzi-lo.
Neste
tocante ensina Rui Stoco quando diz[1]: “cumpre, todavia,
assinalar que não se insere no contexto de voluntariedade o propósito ou a
consciência do resultado danoso, ou seja, a deliberação ou a consciência de
causar o prejuízo. Este é um elemento definidor de dolo. A voluntariedade
pressuposta na culpa é a ação em si mesma”.
O
Código Civil também trata da responsabilidade civil indireta mormente conhecida por ato de terceiro, nos artigos. 932 e 936 a 938.
No
caso estudado, a voluntariedade pode ser vista na medida em que ocorrem
omissões ligadas aos deveres legais de cuidado, vigilância, cuja
responsabilização é imposta por força de lei (aqui leia-se como medidas para evitar o bullying suportado pela aluna).
Deixar
de tomar medidas para proteger a integridade psicológica do aluno simboliza uma
violação legal do dever de guarda que é natural de toda instituição de ensino.
O
Código Civil de 2002 adota a teoria da responsabilidade objetiva em que a
instituição assume o risco de indenizar os danos inerentes de sua atividade
educacional independentemente de culpa.
Isso
significa dizer que; basta que haja um dano ao aluno ou à terceiro dentro da
escola que esta é responsável pela indenização.
Esse
tipo de responsabilidade está prevista no art. 932, IV, no qual versa que a
hospedagem, para fins de educação, faz com que a instituição hospedeira é
responsável pelos atos e pela segurança do aluno.
Já
o artigo 933 define que as pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo
anterior, ainda que sem culpa, responderão pelos atos praticados pelas pessoas
ali listadas.
Isso
é afirmar que enquanto o aluno estiver nas dependências da instituição de
ensino, ela detém responsabilidade pela saúde física e mental do aluno, bem
como é responsável pelos atos ilícitos praticados por ele contra terceiros.
O
dever de vigilância é oriundo da responsabilidade objetiva também prevista pelo
Código de Defesa do Consumidor no seu artigo 14, em que entende a instituição
de ensino como prestadora de serviços, e o aluno como consumidor.
Conforme
os ensinamentos de Aguiar Dias[2] essa responsabilidade
também se aplica às escolas de ensino gratuito em que o Estado responde pelos
danos sofridos pelo aluno em consequência de ato ilícito de outro.
Deve-se
frisar que essa responsabilidade não se restringe somente dentro da escola, mas
também fora dela, como em casos de passeios ou atividades organizadas pela
escola.
É
acertado concluir que o Estado se responsabiliza pelos danos que causados ou
sofridos por alunos ou terceiros em seus estabelecimentos e extensões extramuros.
Essa
afirmação decorre da teoria do risco administrativo, consagrada desde a Constituição
Federal de 1946 que pontificou o fundamento doutrinário acerca da
responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos casados por seus
agentes públicos seja por ação ou omissão durante o exercício da função.
Essa
estrutura teórica traz surge do princípio constitucional da responsabilidade
civil objetiva do Poder Público fazendo com que o Estado traga para si o dever
de indenizar o dano pessoal ou patrimonial sofridos por seus tutelados,
independentemente culpa.
Por
este dever legal, todas as instituições de ensino, ao receberem seus alunos, recebem
também o dever inescapável de atender pela preservação integridade física e psíquica
deles, devendo utilizar todos os meios possíveis para cumprir este dever
jurídico, sob pena de responsabilizar-se civilmente pelos eventuais danos causados
ou sofridos pelos educandos.
[1] STOCO, Rui.
Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: RT, 2007, 2001, p. 95.
[2] DIAS, José de
Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 240.