A
personalidade agressiva na infância é, sem dúvida, o resultado da somatória da
educação basilar vinda do seio familiar com a educação formal e social
adquirida nos bancos escolares.
A
família demonstra à criança parâmetros de comportamentos éticos para a vida
social, a escola dá às crianças ensinamentos técnicos e a noção de regras e
limites para convívio em uma sociedade organizada.
O
resultado desta equação educacional (família+escola) deve desenvolver e
potencializar as capacidades psíquicas, afetivas, intelectuais e sociais da
criança.
Isso
leva a conclusão de que a formação do caráter e da personalidade da criança é
de responsabilidade conjunta da família e da escola.
Quando
algum destes dois grupos basilares falha, a criança desenvolve problemas em seu
caráter. Vejamos dois exemplos:
Quando a
família é desorganizada ou permissiva a criança desenvolve-se sem limites para
o convívio em grupo, uma vez que, não está habituada a obedecer a regras de
conduta social. Já quando a escola não promove de forma adequada o domínio do
conhecimento e o desenvolvimento social do aluno[1],
é provável que o comportamento agressivo adquirido em casa se repita no
ambiente escolar.
Com isso
observamos que as instituições de ensino e família têm sua parcela de
responsabilidade civil objetiva na formação social e educacional da criança.
Sendo assim,
as falhas de conduta que geram danos a outro dentro do ambiente escolar deve
ser compartilhado igualmente entre instituição de ensino e familiares do
agressor.
Conforme
Caitlin Sampaio Mulholland a investigação do nexo causal pode comprovar que o
dano é oriundo de diversas condutas que, conjuntamente, concomitantemente ou
sucessivamente deram causa ao dano[2],
“seja porque cada conduta por si só seria suficiente para causar o resultado
(...); seja porque cada uma das condutas precisaria da outra para complementar-se
e gerar o dano da forma como se deu.[3]”
Em
outras palavras, um ambiente familiar sem estrutura educacional somada a uma
instituição de ensino despreparada contribui para a ocorrência da violência
escolar conhecida como bullying.
Considerando
que cada ente educacional tem sua parcela de culpa, pode-se pensar em
responsabilizá-los coletivamente.
A
responsabilidade coletiva tem por base dois princípios: culpa na atividade
coletiva e guarda coletiva da coisa geradora do dano[4].
O
primeiro princípio se aplica ao caso concreto ao passo que não se pode
delimitar exatamente de quem é a culpa pela conduta agressiva do aluno, mas,
sabe-se que instituição de ensino e a família são responsáveis pelo
comportamento.
Já o
segundo advém da ficção da guarda comum do objeto ou pessoa capaz de causar
dano[5].
Para o caso em tela pode-se aplicar a guarda coletiva quando se reconhece que
tanto a família quanto a instituição deve dedicar-se para evitar que a criança
cause ou sofra um dano.
A
responsabilidade do grupo ou coletiva adviria da violação da obrigação de
guarda.
Neste
diapasão é o obtemperado por Geneviève Viney[6]:
“(...) lorsqu’il est prouvé
que le dammage est dû au fait d’une ou plusieurs choses dont lês “gardiens”sont
tu connus, sans que l’ on puisse détérmier lesquelles, parmi ces, ont été lês instruments matériales du préjudice, la
jurisprudence a tendance aujourd’hui à admettre la condamnation in solidum de
tous le gardiens, sur le fondement de la notion de “garde collective” ou de
“garde em commun”(...)” .[7]
Tanto a
família como a instituição de ensino têm a intenção de contribuir para o
desenvolvimento da psique, desejando o adequado e seguro aperfeiçoamento
intelectual, moral e social da criança, de modo a atuarem de maneira justaposta
no desenvolvimento educacional da criança, de modo que, a falha da primeira
influenciará definitivamente na falha da segunda e vise e versa. Por isso que é
válida a responsabilização conjunta nos casos de bullying ocorridos dentro da instituição de ensino.
Embora
seja
pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre a responsabilidade
civil objetiva dos pais e da instituição de ensino quando a criança encontra-se
sob suas respectivas guardas. Ocorre que em muitas situações a criança reproduz
na escola o comportamento opressor e violento absorvido no ambiente familiar, e
a escola não está preparada tecnicamente para evitar ou frear tal
comportamento. Por isso faz-se justo que se pense em dividir a responsabilidade
entre pais e instituição de ensino nos casos de bullying escolar.
Vejamos a seguir os fundamentos
que asseguram a hipótese de uma responsabilização conjunta entre escola e os
pais para os casos de bullying no
ambiente escolar.
Já observamos que a escola é responsável
objetivamente pelos danos oriundos o bullying
causados pelos seus alunos.
Resta saber, os fundamentos legais que tornam os
pais responsáveis solidários da escola. Vejamos:
Conforme a leitura combinada dos
artigos 1.634, V; 932, I e 933 do Código Civil concluí-se que os pais
representam e assistem seus filhos perante a sociedade até que eles completem
maior idade, ficando eles responsáveis pela reparação dos danos causados por
seus filhos.
Quanto à solidariedade, pode ser
fundamentada no artigo 932, I do mesmo diploma legal que assevera que ainda os
pais também são responsáveis pela reparação civil pelos danos causados
pelos filhos que estão sob sua responsabilidade.
Logo, os
filhos que, estiverem sob-responsabilidade dos pais, e praticarem o ato ilícito
denominado bullying dentro da
instituição de ensino, obrigam objetivamente seus genitores a arcarem de forma
solidária a reparação dos danos oriundos do bullying.
[1] Segundo Libâneo, a educação
escolar adequada é aquela que “mediante a qual a escola promove para todo o
domínio dos conhecimentos e o desenvolvimento de capacidades cognitivas e
afetivas indispensáveis ao atendimento de necessidades individuais e sociais
dos alunos”. (LIBÂNEO, J. C.; OLIVEIRA J. F.; TOSCHI M. S.; Educação escolar:
políticas estrutura e organização. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2005, Coleção
Docência em Formação, p.117)
[2] Mulholland, Caitlin Sampaio, A
responsabilidade civil por presunção de causalidade, Rio de Janeiro, GZ
Editora, 2010, p.213
[3] Mulholland, Caitlin Sampaio, A
responsabilidade civil por presunção de causalidade, op. cit, p.213
[4]
Mulholland, Caitlin Sampaio, op. cit. p.226
[5]Mulholland, Caitlin Sampaio, idem
p. 226
[6] Viney Geneviève e Jourdan,
Pratice Traité de Doirot Civil: les conditions de la responsabilitè Civile.
Paris: LGDJ, 1998, p. 648
[7] Tradução: enquanto é provado que
o dano é devido ao fato de uma ou mais coisas onde os “guardiões” são todos
conhecidos, sem que se possa determinar quais, dentre estas coisas, foram os
instrumentos materiais do prejuízo, a jurisprudência tem uma tendência
atualmente a admitir a condenação solidária de todos os “guardiões”, sobre o
fundamento da noção de “guarda coletiva” ou de “guarda em comum” (...)”